Até os 23 anos, o meu mundo era uma rua que se chamava São Raimundo, número 60, Lago da Pedra, Maranhão. Morava num bairro em que todas as ruas tinham nomes de santo. Uma rua de ladeira que, subindo ia dar na rodoviária; descendo, ia dar num lago pantanoso. A Rua São Raimundo na década de 80 era uma rua esburacada. Não eram buracos pequenos e sim, crateras. Quanto mais chovia, mais os buracos cresciam. Carros passavam com dificuldade, e não foram poucos os que pararam dentro das crateras. Depois veio o calçamento, com pedras escuras, daquelas que fazem estrago na perna de um desavisado. Mas o engraçado é que justamente na frente da minha casa, a pedra escura faltou e eles colocaram uma branca, lisinha, linda. Motivo de orgulho pros moradores do início da rua e de invejas pros de cima.
Uma vez, decidi que ia embora. Foi fácil. Só subi a rua, cheguei na rodoviária, comprei uma passagem pro sudeste, me despedi da família e dos amigos e vim embora, sem olhar para trás, com medo de virar estátua de sal: "Mundo, mundo, vasto mundo. Se eu me chamasse Raimundo, seria rima, não seria solução". Ai Drummond, poeta querido, você se chamava Carlos; eu, Cláudio. Mas sei o quanto o nome do santo me deu impulso.
Depois que saí de lá, colocaram asfalto. E juro que fiquei decepcionado quando retornei e vi o breu escuro tomando conta dela. Ela não era a rua da minha infância. A rua São Raimundo não existia mais diante de mim. Ficou para sempre escondida na minha memória.
3 comentários:
C: não se deve voltar, assim como não se deve reler (na minha opinião). Seu texto está tão gostoso, estilo fluente, envolvente.
Cláudio,
Sei como você se sente. Eu também quando retorno à minha cidadezinha lá no interior do Ceará, fico frustrada.
A lua, já não brilha como antes, a luz elétrica ofuscou a claridade.
Beijos...
Gostei muito do texto. Sabes que adoro retornos à infância.
Beijinho
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