sexta-feira, 25 de março de 2011

poema para "ARQUEOLOGIA DE UM TSUNAMI"

O meu velho amigo piano
jaz no lago
com suas medrosas teclas
ponta de iceberg silencioso.
Aquele antigo vinil
guardado como uma relíquia
está quebrado junto às pedras
da calçada
silencioso.
O tiranossauro do meu filho
perdeu as patas
já não ruge.
O romance preferido
da minha esposa
virou encharcada flor
na poça de lama
e as letras se turvaram,
silenciosas para sempre.
Nossas lembranças se espalharam
pela cidade, nas fotografias
que a água levou.
A prancha de surf retornou;
meu filho, não.
Seu espírito surfa
nas silenciosas ondas.
Também o elefante da sorte,
o mangá favorito,
o notebook, a câmera fotografica,
o controle do game...

todos
em uníssono
silêncio


confira essas belas imagens clicando no título do poema

sexta-feira, 11 de março de 2011

Das cores do céu

Vialactea
Via-láctea, pintura digital a dedo, no iPad.
Um dia, nao faz tanto tempo, desejei ser astrônomo. De tanto olhar para o céu noturno, e ver o colorido das estrelas, de tanto dar nó na camisa ao ver cometas riscarem o infinito, de tanto ver o caminho de leite derramando-se de oeste a leste. 

Eu tinha decidido que seria astrônomo, cuidaria dos astros, contaria constelações, mapearia nebulosas e buracos negros, descobriria novas galáxias repletas de planetas habitáveis, como a Terra. Vivia mesmo de cara pra cima, feito tonto, olhando nuvens, observando as nuances do brilho do sol na atmosfera. Foi nessa época que a professora pediu para fazermos um desenho bem bonito de uma paisagem. Fiz montanhas repletas de palmeiras, fiz casinhas tortas fincadas em ruas também tortas. Pintei um céu magnífico, bem vermelho, com leves rajadas de lilás. 

No outro dia, a professora me chamou, apontou para meu desenho, o dedo bem no meu céu, e disse: "sua pintura está legal, mas essa cor não serve para pintar céu." Antes que eu perguntasse o porquê, ela logo completou: "Cor do céu é azul, menino". Peguei meu desenho, guardei bem guardado na minha pasta e saí pensando se a professora nunca tinha visto céu de entardecer ou céu que está perto de desabar uma chuva. 

Decidi que nunca pintaria céu azul, nunquinha. Meu céu podia ser amarelo, vermelho, verde até . Mas azul não; azul era cor de todo mundo e meu céu não podia ser assim tão presentificável, tão dado a qualquer um, tão bobo. Isso só me fez aumentar o desejo de ser estudante de astros. 

Mas o que eu não sabia era que pra estudar os astros seria preciso fazer complicados cálculos matemáticos, precisava saber muita coisa de física. E eu nunca consegui fazer a conta mais simples. Será que quem criou o mundo antes fez projeto dele e realizou inúmeros cálculos? Que graça tem nisso? O mundo foi feito para ser apreciado, não calculado.