sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

O primeiro natal

O Menino-Deus, tão indefeso ali na manjedoura, ri para o mundo e aponta com seu dedinho para a estrela. Riso de criança celeste, dedo de criança curiosa apontando luz. As ovelhas trazem lã para Maria tecer uma fralda quentinha. O burro bafeja a palha para fazer calor. Uma família de pastores desce a montanha e traz comida para o casal faminto: pão, leite e mel. O cachorrinho-pastor pula aos pés da criança divina e brinca com seu próprio rabo. A criança divina ri. José e Maria riem. Os pastores riem. O primeiro natal acontece entre luzes, preces e risos.

domingo, 18 de dezembro de 2011

nuvens do advento

"Que as nuvens se abram e chova a justiça. E o orvalho faça nascer a flor." (Isaías)

 

É assim, um céu grávido de nuvens escuras, que os homens esperamos o desabar do novo sobre nossas cabeças. O novo seja vento a limpar a sujeira do caminho, seja água germinando o sêmen da terra, seja planta perfurando o lodo e se projetando para a luz. Que essas nuvens, que eclipsam o sol, deixando apenas pontos dourados perfurarem sua densa textura, nos presenteiem com um novo tempo, onde a justiça e a igualdade sejam nosso alimento; o cordeiro e o lobo sejam amigos e pastem juntos, como sonhou o profeta.

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Momento

No momento não posso. Mas é só neste momento. Quem sabe depois. Quem sabe amanhã, assim que os primeiros raios do sol espalharem fios de ouro pelas bordas das montanhas. Ou quando a estrela da tarde despontar diáfana, feito água-viva. Ou quando a noite trouxer o manto da brisa, amorosamente gélida. Mas no momento não posso. No momento só posso estar em contemplação, escondido na minha própria fractal, persuadido pelas vozes que me habitam. Não sou silêncio. E o vazio não me vem como tsunami porque estou cheio. Nada me atinge. Nem a força de mil sóis. Nem as chamas do Etna. Nem uma nova Big Bang. Nem a notícia de que os cientistas encurralaram a "partícula de Deus". Nada me dilacera a alma. Este momento é só meu.

domingo, 4 de dezembro de 2011

O vou

Quando as palavras vão embora, quando o vento leva a chuva refrescante, quando a noite esconde o sol, quando as nuvens eclipsam a lua, quando as montanhas escondem o horizonte, quando o mar engole o barco, quando o silêncio leva embora os pensamentos...
É aí a hora de ver diferente, de enxergar o profundo. É nesse instante que sondamos outras nuances e os rios se apresentam como caminho, e o caminho de terra batida nos diz muitas coisas. Que o perigo é toda parte, enquanto respirarmos, o perigo grande existe, o perigo da existência.
Mas é ele, o perigo grande, que nos projeta ao vou. O vou é muito mais que o voo. O vou não tem ambiência, não tem história, não tem sequer cara e corpo.
Ele é o imenso desejo.